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domingo, 26 de fevereiro de 2012

Os negros e o poder: a importância das candidaturas negras.

                                                                              
Professor Toninho
Presidente Municipal do PSOL de Embu das Artes


Em 21 de fevereiro de 1965, uma das vozes mais radicais do protesto negro norte-americano foi ouvida pela última vez, para uma assistência formada por colaboradores mais próximos, em torno da OUAA (Organização da Unidade Africano-Americana), inspirada nos ideais do Panafricanismo e da libertação do continente africano do jugo colonialista. Este ano completam-se 47 anos de sua morte.

Malcom X já figurava há anos nas listas do FBI e da CIA e todos os seus passos eram monitorados pelas agências de inteligência do império. Quando Malcom X rompe com os Mulçumanos Negros liderados por Elijah Muhammad, ele inicia uma viagem a Meca e ao Oriente Médio, a África e a Europa onde estabelece contato com os movimentos de libertação africano, comunistas, socialistas e revolucionários.
Este contato faz com que Malcom rompa os estreitos limites do nacionalismo negro – a ideia de que a libertação do negro norte-americano se daria pela formação de um estado negro na América – pela necessidade da unidade histórica dos povos não-brancos em luta contra o domínio imperialista. O líder negro norte-americano, desta maneira, introduz a necessidade de não apenas os negros se organizarem no sentido da busca do poder, mas da transformação da ordem dominante, da subversão do “poder branco” constituído não apenas pela formação de um novo “estado negro burguês”, mas de um amplo movimento revolucionário que unisse todos os povos subjugados pelo colonialismo e racismo. Logo, este novo poder – emanado dos ideias do Panafricanismo radical – seria tributário dos sujeitos históricos que se lançaram por edificar um novo edifício social dos escombros do capitalismo racial.

As lutas dos povos negros, na África e na Diáspora, continuam. Logo, a questão do poder não foi algo que ainda está em aberto. Lutar para nos inserir nesta ordem capitalista, colonialista e racista ou, ao contrário, subvertê-la pela emergência de novas formas de organização dos sujeitos da sociedade civil, da economia e do estado? Hoje, com os processos de redemocratização da América Latina, no qual os afro-descendentes tiveram destacada atuação, o surgimento de partidos políticos nos permite apresentar candidaturas negras, com potencial de identificar-se com as aspirações de nosso povo.

Infelizmente, a atitude preferencial das candidaturas negras é, ainda, omitir-se diante do problema do racismo em nossa sociedade. Raramente os candidatos negros assumem o debate racial como algo importante em sua plataforma política. Por outro lado, há uma tendência de adequação dos parlamentares negros, quando eleitos, aos limites da ordem institucional burguesa, ou seja, somos pressionados a reproduzir o padrão de “poder branco” dominante. Sub-repticiamente, a ideia de um “estado negro burguês” – que Malcom X abandona nos últimos anos de sua trajetória – reaparece no projeto de formação de uma elite negra docilizada, conformista e adequada aos cânones do poder dominante. Dentro deste projeto, tornamo-nos não construtores de uma nova ordem, mas sócios minoritários da ordem estabelecida. Não podemos confundir este projeto de elite negra, evidentemente, com os efeitos positivos e redistributivos das políticas de ação afirmativa, que tem como objetivo de corrigir distorções históricas, produto do racismo e da exploração econômica. Porém, elas não são um fim em si mesmo, mas parte de um projeto mais amplo de transformação social.

Temos, portanto, que enfrentar três questões:

A primeira, a ideia de que nós, negros e negras, não devemos disputar parcelas do poder político estabelecido.
Para um setor do movimento negro e da população negra, literalmente, a política é “coisa de brancos” – algo que não nos devemos meter. É necessário afirmar a vocação dos afrodescendentes ao exercício do poder político, disputando os espaços de representação institucional, afirmando-nos como sujeitos políticos fundamentais à formação do estado nacional.
Para outro setor, os partidos e a luta pela ocupação de espaços institucionais – pela disputa de cargos eletivos – seria uma forma “branca” e politicamente desorientadora de nossa estratégia “negra” e “africana” de luta pelo poder. Esta posição é equivocada porque deixa de partir de uma ação concreta e trabalha com a ideia de que o estado é uma estrutura imutável, incapaz de ser modificada pela ação política dos sujeitos sociais. Há um estado “branco” real e concreto, e outro – “negro” – que só pode existir em nossas mentes. Aqui não se trata de opor o estado branco a um poder negro que queremos construir: mas de lutar para que o estado se modifique no sentido de que as aspirações de nossa comunidade sejam realizadas.

A segunda, a ausência de uma plataforma política que unifique o conjunto das candidaturas negras. A construção desta plataforma política deve ser tarefa das organizações do movimento negro, popular e quilombola e assumida pelo conjunto das candidaturas identificadas com as aspirações da comunidade negra. O CONNEB – sepultado pelas entidades do movimento negro identificadas com o lulo-petismo (Conen e Unegro) – poderia ser uma importante ferramenta neste sentido.

A terceira, é pensar a ação institucional nos limites da atual ordem estatal. São tímidas as ações institucionais que procuram romper com séculos de uma ordem estatal voltada à manutenção dos privilégios da elite racista e burguesa dominante. No mais das vezes, nos situamos nos limites desta ordem. Projetos de iniciativa popular, assembléia de entidades negras, consultas periódicas são substituídos – no mais das vezes – por fóruns de caráter apenas consultivo (e não deliberativo); conselhos de “representantes” (como o da Seppir); ações institucionais com pouca ou nenhuma participação dos sujeitos diretamente interessados e afetados por elas; e leis que são mais “carta de intenções” que conquistas efetivas, a exemplo do que foi o acórdão entre DEM e PT que aprovou um conjunto esvaziado de leis que atende pelo nome de Estatuto da Igualdade Racial. Nada disto descarta as conquistas que alcançamos através da luta institucional – e podemos alcançar pela eleição de parlamentares negros - porém não retiram da ordem do dia a socialização e descentralização do poder político. A possibilidade de que o poder seja exercido diretamente pela maioria oprimida de nosso país.
Logo, não nos parece um fenômeno aleatório que partido como o PSOL sejam o que, no último período, mais tenha apresentado candidaturas negras identificadas com as principais reivindicações da comunidade negra (reparações, ação afirmativa, titulação e homologação do territórios quilombolas, denuncia e combate da faxina étnica e  do extermínio da juventude negra, defesa e valorização da cultura negra, defesa da liberdade religiosa e das religiões de matriz africana). Os partidos, de uma maneira geral, tendem a se parecer cada vez mais uns com os outros, tendo cada vez mais dificuldade em se identificar com as bandeiras de luta de nossa comunidade.

A enfrentarmos as questões acima avançaremos em afirmar a importância das candidaturas negras no sentido de realizar a utopia libertadora de Malcom X e dos líderes panafricanistas radicais.


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